O encontro com a egoência

Claudio Moreira

É muito interessante e importante observar a necessidade que Santiago Bovisio, fundador de Cafh, e Muñoz Soler* tiveram de criar uma palavra, até então inexistente, para significar uma qualidade nova a ser reconhecida no ser humano: a “egoência”. Perceberam eles que, para caminhar da angústia existencial incidente em cada alma, até chegar à mística do coração, o homem novo deve ter consciência de uma nova qualidade a ser desenvolvida em seu interior, a “egoência”, podendo ser entendida como a consciência do ego, mas de um ego inclusivo do todo, holístico, universal.

Ao falarmos de ego, não se fala aqui daquele ego antigo, instintivo, separatista, para o qual a palavra ego foi primitivamente cunhada, mas, sim, de um novo significado para uma palavra antiga, um significado que inclui uma nova visão do mundo e da natureza. Muito nos auxiliará nesta reflexão acompanhar o desenvolvimento da ciência em geral e da física em particular, ao longo do tempo mais recente, desde a física de Newton, há trezentos anos atrás.

A física entendida como a leitura da natureza pela ótica da razão guarda, como não pode deixar de ser, uma estreita relação com a filosofia, com as religiões, com o pensamento e com as visões espirituais do homem, apesar de sua imprevisibilidade factual.

Ilya Prigogine, prêmio Nobel de química em 1977, afirma em sua obra “O fim das certezas”: “Sempre pensei que a ciência era um diálogo com a natureza. Como em todo diálogo de verdade, muitas vezes as respostas são inesperadas”. Mesmo assim, o pensamento humano ainda hoje prevalecente no planeta, apesar do enorme desenvolvimento da ciência, é aquele baseado na física de Newton, caracterizada como a física da realidade aparente, da continuidade, dos fenômenos reversíveis, das certezas. E, para expressar este pensamento, o homem construiu uma linguagem adequada a ele, com as mesmas características, tanto para a sua comunicação verbal, quanto para a sua comunicação escrita, quanto para a sua matemática, que também é uma forma de linguagem.

Quando, nas primeiras décadas do século XX, Albert Einstein formula as suas teorias da relatividade, especial e geral, para expressá-las usou, já no limite de suas possibilidades, a linguagem falada/escrita, mas teve que usar uma linguagem matemática mais desenvolvida, não só por ele como por diversos outros matemáticos.

A FÍSICA QUÂNTICA

Por volta do ano de 1900, Max Planck, físico alemão, descobre que o aumento ou decréscimo de energia em um sistema qualquer se dá aos saltos, em pequenos saltos de energia; a essa pequena e constante quantidade de energia se deu o nome de “quantum” ou “constante de Planck”.

Louis De Broglie, físico francês, em 1924, formula a teoria da dualidade partícula–onda, quando constata que, ao nível subatômico, um fóton se comporta como uma partícula e também como uma onda, dependendo de como se observa o fenômeno, o que vem a se constituir numa radical mudança da visão da natureza da qual fazemos parte, devido, em outras palavras, à luz (fóton) se apresentar como duas entidades mutuamente excludentes, como uma partícula ou como uma onda, dependendo da medida feita pelo observador, de uma forma ou de outra. Esse fato é verdadeiramente espantoso para o nosso entendimento corrente. Seguindo essa sequência de descobertas em 1927, Werner Heisenberg lança a “pedra fundamental” da física quântica, formulando o “princípio da incerteza” que diz que uma partícula subatômica, definida por suas várias características, quando medida, por exemplo, por sua localização, não pode ser medida simultaneamente por sua velocidade ou por outra qualquer das suas características.

NÃO LOCALIDADE

Cinco a seis décadas depois, portanto, ainda no século passado, em 1982, vários cientistas, em diferentes partes do mundo, comprovam simultaneamente experimentos de “não localidade”, que Albert Einstein desacreditava, referindo-se a esta “misteriosa ação à distância”, passando a ser uma das razões pelas quais ele desconfiava da mecânica quântica como realidade, apesar de certificar a justeza da matemática que a descreve. Por “não localidade” entenda-se a capacidade de uma entidade quântica, como um elétron, por exemplo, influenciar instantaneamente outra partícula quântica à distância, mesmo sem ter ocorrido nenhuma troca de força ou energia entre elas.

Como não podia deixar de ser, a comprovação, à luz da mecânica quântica, do fenômeno da “não localidade”, abalou os alicerces da física, como cita Lynne MacTaggart em seu livro “O Campo”: “O assunto não mais poderia ser examinado em separado. As ações não precisavam ter uma causa observável em um espaço observável. O axioma mais fundamental de Einstein não estava correto: em certo nível da matéria, as coisas podiam viajar mais rápido do que a velocidade da luz. As partículas subatômicas não encerravam nenhum significado enquanto entidades isoladas, podendo apenas ser compreendidas por intermédio dos seus relacionamentos. O mundo, em sua essência básica, existia como uma rede complexa de relacionamentos interdependentes, para sempre indivisíveis.” “Talvez o componente mais essencial desse Universo interligado fosse a consciência viva que o observava”, conclui MacTaggart.

O CAMPO DO PONTO ZERO

“Zero Point Field”, em inglês, é o tema central do livro já citado, “O Campo”, onde se relata a história da fronteira da ciência a que chegaram respeitados cientistas em todo o mundo, já agora no século XXI.

O “campo do ponto zero” é um campo energético que conecta tudo no universo, e nós, seres vivos, fazemos parte desta grande conexão dinâmica de “artimanhas” de troca de energia. O vácuo, como nós o conhecemos, não é um vazio como se pensa; é, antes de tudo, uma parte desse campo.

Mas, a essa altura, pode estar o leitor se perguntando se está lendo o artigo a que se propôs ler: “O Encontro com a Egoência”. Cabe portanto tentar esclarecer o propósito desse passeio rápido pela história da física, até ontem.

Ramon Pascoal Muñoz Soler, ao escrever, em 1969, o livro “O Caminho da Egoência”, onde discorre sobre o termo para expressar uma nova ideia, estava, com grande clareza de visão, percebendo o papel do homem emergente nessa nova “narrativa” da natureza que a ciência nos oferece. O novo homem “egoente” será um homem buscando permanentemente a expansão da sua consciência dinamicamente inclusiva, abarcando o todo, privilegiando a dúvida no lugar da certeza, a pergunta no lugar da resposta e, quem sabe, a intuição no lugar da razão. Esse emergente homem “egoente” buscará construir uma linguagem adequada que inclua os novos significantes para significar essa nova “narrativa” da natureza.

A ciência e a espiritualidade, cada vez mais, caminham juntas; cabe a esse novo homem “egoente” fazer parte dessa união.

“A elasticidade da realidade é proporcional e equivalente à elasticidade da consciência. Todas as dimensões em que estamos inseridos são fruto de nossos paradigmas, nossa forma peculiar de ver a realidade. Em outras palavras, a realidade é a materialização do estado em que nossa consciência se encontra.” (Extraído de um artigo de Dulce Magalhães na internet).

*Ver a propósito deste autor a resenha de “Germes do Futuro no Homem”, página 32 desta edição.

BIBLIOGRAFIA
Muñoz Soler, “O Caminho da Egoência”. Ed. ECE
Alan Watts, “The Wisdom of Insecurity” – “A sabedoria da insegurança”, Ed. RECORD
Ilya Prigogine, “O fim das certezas”, Ed. UNESP
Lynne McTaggart, “O campo – Em busca da força secreta do universo”, Ed. ROCCO
Danah Zohar, “O ser quântico”, Ed. BEST SELLER
Danah Zohar, “Sociedade quântica”, Ed. BEST SELLER
Gary Zukav, “A dança dos mestres Wu Li”, Ed. ECE

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