Imprevisibilidade: o fio pulsante da vida

Toda vez que observamos, como um espectador, um momento importante de mudança, social ou individual, somos confrontados com a imprevisibilidade.

Quem poderia, em plenos anos 60, imaginar o fim da guerra fria? Quem poderia, vendo aquela mulher submissa aceitando os maus tratos do marido, imaginar que ela se transformaria num baluarte na luta contra a violência às mulheres e daria nome à Lei Maria da Penha?

Mal conseguimos compreender o passado. Como poderíamos antecipar o porvir? Imprevisível. São tantas vidas individuais e coletivas interagindo, modificando-se mutuamente num devenir contínuo, num grau de complexidade de interações tão elevado que escapa ao nosso controle.

Tudo se relacionou com tudo. Tudo se relaciona com tudo. Ontem, hoje. Aqui e lá. Agora, em todas as partes.

A complexidade transforma em irrisória nossa pretensão de explicar, controlar, prever. 3% conhecido, visível. 97% desconhecido, invisível, imponderável.

Mas, inconformados de deixar-nos levar à deriva nesse imenso rio da vida, respondemos a esse dinamismo e complexidade tentando simplificar: desmembramos as partes do todo, estudamos seu funcionamento isoladamente, nomeamos, classificamos. Agrupamos os fatos em “pacotes” com critérios que nos parecem lógicos, mas que, de fato, espelham nossos próprios condicionamentos mentais.

Como agrupar e classificar não resolve ainda a questão da imprevisibilidade, construímos modelos e teorias e, com a mente repleta desse arcabouço criado por ela mesma, tentamos nos aproximar da realidade. E esta dá um passo mais para trás porque, entre nós e a realidade estão nossas teorias, nossos modelos, nossas classificações, enfim, todos nossos “pacotes” de realidade.

Quando essas teorias se mostram insuficientes para abarcar o todo, quando nossos modelos colapsam, quando sentimos novamente, depois de tantos esforços racionais, que definitivamente não estamos no controle, desesperamos. Como se a vida perdesse sentido. Sim, a vida perde o sentido artificial que havíamos atribuído a ela. Nesse ponto, por que não tentarmos abordar as coisas de outra maneira?

Em vez de tentar reduzir para explicar, deixar a complexidade explodir sem limites em miríades de formas, algumas visíveis e outras nem tanto, num caos criativo que, por fim, dança.

Tem uma pulsação. Desde o mais íntimo de nosso coração, na imobilidade de nossos movimentos racionais, conseguimos ver o fio pulsante da vida, que preenche os seres, os fatos, as coisas.

Esse fio pulsante, que só pode ser visto de dentro para fora, nos conecta com o coração das coisas e nos leva à consciência de uma realidade maior (que nossos pacotes!), toda interligada, interdependente, inclusiva. Tão inclusiva que até nosso mundo racional cabe nela! Cabe, mas não preenche.

Quando somos capazes de transitar por esse fio pulsante da vida, de dentro para fora e de fora para dentro, nossa posição se transforma definitivamente: não somos mais o espectador assombrado com o imprevisível, do início de tudo, nem o gerente estressado do mundo, querendo controlar e explicar tudo. Tomamos a função de dançarinos cósmicos. Conectados conscientemente com essa pulsação íntima, dançamos ao seu compasso, harmonizando cada movimento individual com o Grande Movimento.

Isto é um convite: deixar de gerenciar, apenas dançar.

Daniella Dupont Zaffuto é empresária e reside em São José dos Campos–SP. Membro de Cafh desde 1984.

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