Interdependência e mudança

Todo o bem que eu puder fazer, toda a ternura que eu puder demonstrar a qualquer ser humano, que eu os faça agora, que não os adie ou esqueça, pois não passarei duas vezes pelo mesmo caminho.” James Greene

As pessoas buscam a felicidade, e muitas são as indicações acerca dos meios, caminhos, métodos a se seguir para atingir tal objetivo. Muitos focalizam sua atenção na remoção do que consideram obstáculos, ou na obtenção daquilo que pensam ser necessário para serem felizes – geralmente bens materiais, que proporcionem maior conforto, segurança, prazer. Após algum tempo agindo dessa forma, pode o ser perceber que está buscando a alteração de algo externo a si, e que pouco controle tem com relação a tais circunstâncias. Por mais que busque “consertar” o que está errado em sua vida, não consegue resolver todos os problemas. Ao superar uma dificuldade, outras mais surgem.

Não temos condições de controlar o que ocorre ao nosso redor; mas podemos estar no controle do que ocorre internamente. Como fruto de nossas reuniões, estudos, diálogos e meditações, percebemos a necessidade de trabalhar sobre nosso Ser, de modo a produzir sua evolução. Devemos buscar reduzir a oscilação de nossas emoções, controlar a forma como nos comportamos perante os acontecimentos.

Não existe nada permanente, exceto a mudança. Porém, mudar, e mudar para melhor, são coisas diferentes. As pessoas não resistem às mudanças, resistem a serem mudadas. É um mecanismo legítimo e natural de defesa. Porém a mudança é tão certa quanto nascer e morrer. Não há nada que permaneça; tudo muda. Se por um lado essa constatação pode gerar medo, insegurança, por outro nos indica que precisamos estar desapegados. Isso fará com que não sejamos mais atingidos com tanta força pelas mudanças que ocorrem ao nosso redor. Além disso, se tudo muda, nós também podemos mudar. E, ao mudarmos, talvez nosso exemplo possa inspirar os demais a fazerem o mesmo.

Todavia, temos medo de mudar. Trata-se de um processo difícil, motivo pelo qual as pessoas não se arriscam a mudar absolutamente nada! Continuam fazendo tudo igual, todos os dias, automaticamente, como se fossem máquinas, como se por trás dessas atitudes não houvesse uma nobre missão a ser cumprida, como se a vida fosse uma sequência de atitudes sem sentido e mecânicas…

Mas, antes da mudança, vem o despertar. Esse é o ponto de partida: tornarmo-nos conscientes do momento presente. Precisamos adquirir a condição de entender o que está se passando no nosso mundo interior para que possamos aprender a lidar com nossos sentimentos. Muitas vezes estamos adormecidos para o que está acontecendo a nossa volta, e para o que estamos fazendo. Todo homem toma os limites do seu campo de visão como os limites do mundo. Por isso esta luta se trata de quebrar paradigmas. Criar e difundir novas atitudes. Não desistir, mesmo sentindo a mente turva. Todos vivemos sob o mesmo céu, mas nem todos vemos o mesmo horizonte. E quando se tem o horizonte turvo, é preciso olhar para trás para manter o rumo. Um antigo ditado diz que a vida só pode ser compreendida olhando-se para trás, mas só pode ser vivida, olhando-se para frente. Querer mudar é o primeiro passo. A partir daí, podemos dedicar nosso tempo diário, cada instante, na busca de lições em nossas vivências, transformando-as em hábitos.

Começamos a despertar quando oferecemos menos resistência às dificuldades que a vida impõe e começamos a lidar melhor com estas dificuldades. Despertamos quando aprendemos a descansar em lugares tranquilos e a deixar para trás as coisas que não precisamos carregar, como ressentimentos, mágoas e decepções. Quando aprendemos a valorizar não o olhar, mas a coisa olhada; não o pensar, mas o sentir. Quando aprendemos que as pessoas não estão contra nós, mas a favor delas. Quando nos colocamos no lugar do nosso próximo e sentimos sua dor com toda sua intensidade e nos permitimos tomar a atitude que gostaríamos de receber se estivéssemos sentindo aquela dor.

Na obra Luz no Caminho, de Mabel Collins, encontra-se a seguinte indicação: “busca a flor que deve abrir-se durante o silêncio que segue à tormenta […]”. IOGUE RAMACHÁRAKA (William Walker Atkinson), ao comentar essa passagem em curso adiantado de filosofia iogue, refere que essa flor é a Consciência Espiritual. Ao surgir, indica que o despertar ocorreu, que o verdadeiro desenvolvimento começou. Lembra o autor dos três princípios mentais: Mente Instintiva, Intelecto e Mente Espiritual. O homem que se encontra no estágio instintivo ocupa-se somente com o plano físico e a satisfação de suas necessidades e desejos. Não se importa com os verdadeiros objetivos da vida, estado que se caracteriza como a infância da Humanidade.

Prossegue o autor apontando que, depois de algum tempo, o Intelecto se manifesta. Nesse momento, os desejos se multiplicam e a pessoa passa a procurar satisfazê-los, pensando que aí reside a felicidade. Todavia, alerta que “não se encontra felicidade permanente neste estado; alguma coisa enche a alma com uma inquietação sempre crescente, incitando-a a voos mais altos.” O Intelecto não é capaz de resolver as questões fundamentais, o que gera grande inquietação, que corresponde à tempestade.

A primeira indicação da chegada da Consciência Espiritual, segundo Ramacháraka, se dá quando percebemos a realidade do Ego, quando sentimos a existência da Alma. Esses são os primeiros degraus da Consciência Espiritual, do desabrochar da flor, que se dará em dois momentos: a plena percepção da consciência do “Eu Sou”; e o Conhecimento Cósmico. A percepção da consciência do “Eu Sou” é o botão da flor, e a flor mesma será o Conhecimento Cósmico.

A partir desse momento, a mudança tem lugar e a pessoa não será mais como antes, o que se evidencia a partir de suas ações: Ele se torna mais alegre e feliz. Coisas que inquietam seus vizinhos parece ter pouco efeito sobre ele. Não acha bom lamentar e afligir-se por certas coisas que afligem a seus vizinhos. Muitas vezes parece não ter sentimento nem coração, e apesar disso está cheio de Amor e Afabilidade.

A sua atitude mental está mudada. Ele tem outro ponto de vista. Acha que cessa de ter medo, e pode parecer aos outros como descuidado e sem ideia. O tempo tem para ele menos importância, porque possui a ideia de eternidade. Não o intimida a distância, porque sabe que todo o espaço é seu.

O Conhecimento Cósmico é a flor perfeita: aquilo que vem como resultado da Iluminação. Nesse estado, a felicidade não se busca mais; ela já está presente.

Como todos os demais, também as Filhas e os Filhos de Cafh procuram a felicidade; procuram despertar e colocarem-se a postos para empreender o caminho do desenvolvimento espiritual.

Em nossas ensinanças, aprendemos exercícios diários que nos ajudam nesse processo. Aprendemos a estar em estado de oração e aquietar a mente. Tomamos conhecimento de que, ao acordar, nosso primeiro pensamento deve ser de agradecimento e amor intenso a Divina Mãe e ao divino que existe em nós. A meditação discursiva e a afetiva atuam sobre nossos pensamentos e sentimentos, ocasião em que podemos encontrar paz interior e desenvolver um comportamento de amor e compaixão. Somos orientados a, durante o dia, encontrar momentos de oração, seja ela vocalizada – repetir salmos ou orações – ou não vocalizada – repetir mentalmente palavras com repetição de sons que se sucedem a intervalos regulares, com harmonia pausada, podendo acompanhar o som do coração. No final do dia, nos dedicamos à prática da reflexão retrospectiva, que consiste na lembrança dos acontecimentos, do momento presente até o despertar, sem julgamentos, lembrando do pior momento – aquele em que não conseguimos ser amorosos ou termos compaixão e também do melhor  – quando conseguimos ser amorosos e ter compaixão – para podermos pedir a Divina Mãe que nos ajude a evoluir e para lembrarmos que temos condições de fazê-lo.

Esse método proporciona o surgimento das mudanças em nosso dia a dia, trazendo muita paz, harmonia, amor e compaixão. Dá-nos a percepção de que podemos fazer a diferença para a nossa vida e para a das pessoas que nos cercam, com uma atitude amorosa, compreensiva.

Parece fácil, mas não é! Muitas vezes nos desviamos do caminho. Em momentos de descontrole, raiva, ou injustiça, descarregamos as nossas frustrações nas outras pessoas. Neste momento crucial, esquecemos de parar, respirar e pensar um pouquinho se devemos fazer aquilo que o nosso impulso diz que sim e o coração diz que não.

Quantas coisas acontecem nestes momentos de falta de reflexão e ponderação, simplesmente porque fazemos aos outros o que não gostaríamos que fizessem a nós. Além da agressão ao outro, segue- se a culpa. E esta culpa é desperdício de energia. Deve-se, por isto, exercitar o auto perdão, uma vez que somos seres humanos tentando aprender.

Aqueles a quem temos dificuldade de amar, provavelmente, sentem o mesmo em relação a nós, vendo-nos também como pessoas difíceis. Devemos sempre lembrar que somos seres humanos passíveis de erros. Não devemos esperar mais do que atitudes humanas, mas sempre reconhecendo as imperfeições e buscando corrigi-las.

Esta é uma luta que deve ser travada diariamente, com paciência e sabedoria, ajustando a palavra à ação e a ação à palavra. Nós passamos por várias guerras internas e externas durante nossa existência: “combater a si próprio é a mais dura das guerras, vencer a si próprio é a mais belas das vitórias” (Logau).

Amar ao próximo, desenvolvendo o amor em nós, deve ser o nosso objetivo, se quisermos nos tornar, a cada dia, pessoas melhores, mais felizes e em paz. O amor ao próximo leva-nos a nos amarmos, sem egoísmo e sem ilusões; leva-nos ao amor incondicional: amamos apenas porque isto nos faz bem.

Caminhamos pela vida cruzando com muitas almas, mas sempre encontrando a nós mesmos. Nenhum de nós veio para este mundo com um manual de instruções, para sabermos qual deveria ser a melhor atitude a ser tomada, mas sabemos que quem planta laranjas não irá colher cerejas. As situações que encontramos na vida refletem aquilo que plantamos um dia.

Sabendo-se disso, resta pedir o auxílio da Divina Mãe, para que tenhamos disciplina e perseverança. Com esforço, talvez possamos despertar e romper o ciclo que nos limita e nos traz sofrimento, e atingir, um dia, o estado do Amor Real, da união com o todo, do arroubamento.

Como a semente regada e cuidada com amor floresce e se transforma em uma bela árvore, que o mesmo aconteça com nossas vidas, e possamos, enfim, viver o amor que semeamos. E nos darmos conta de que é preciso, apenas, saber plantar para podermos colher. Se a semeadura é livre, a colheita é obrigatória.

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