Recordar e compreender

Primeiro compreendemos, depois tomamos decisões e depois agimos. Não sendo assim, agiríamos movidos por impulsos e reações, em detrimento de nosso desenvolvimento.

Compreender o que vivemos nos permite avaliar o que acontece conosco, distinguir nossas opções, estabelecer nossas prioridades e discernir as consequências de nossas determinações. Através deste processo podemos aplicar a vontade em esforços que promovem nosso adiantamento.

Compreender também é um processo que implica atender, recordar, incluir, entender e localizar tudo isto dentro de um contexto adequado. Atender requer calar para poder perceber – e escutar – para não deformar o que percebemos.

Estamos habituados a atender filtrando o que chega a nós para deixar passar só o que nos interessa ou nos convém. Selecionamos arbitrariamente, da mensagem completa da vida, para ficar com migalhas de informação. É certo que nossa atenção tem limites, mas raramente os conhecemos. Quando atendemos, reduzimos ao extremo nossa mira, enquanto nosso discurso interno luta por ocultar as evidências que nos rodeiam.

Ao atender, desenvolvemos nosso interesse e nosso amor por tudo e por todos que nos rodeiam. Ao atender, tudo o que acontece, acontece conosco e nos ensina. Nossa atenção evidencia em que grau amamos nosso ideal de liberação interior e de conhecimento de nós mesmos, e em que medida aprendemos de nossas experiências, da vida.

Recordar implica registrar e validar o que percebemos. Tudo o que nos acontece permanece em nossa memória; mas não tiramos proveito disso se não nos lembramos. Recordamos especialmente aquilo a que damos relevância, e não nos lembramos dos acontecimentos que não nos interessaram ou que não queremos recordar. O certo é que estamos envolvidos em tudo o que aconteceu.

No entanto, se recordamos o passado, mas não nos incluímos nesse passado, reduzimos o que foi vivido a uma sucessão de incidentes e relatos sem conteúdo, sem ensinança, alheios ao que consideramos nossa vida. Além de atender e recordar, para compreender é necessário que nos incluamos em tudo o que acontece.

Incluir-se implica comprometer-se. Através da atenção e da lembrança incorporamos mais e mais realidade no que percebemos e ao incluir-nos em nossa percepção, comprometemo-nos com o que conhecemos. Tanto nós como o que consideramos pertencem ao mesmo contexto. Necessitamos incluir-nos de forma deliberada e consciente no contexto para que nossas percepções não se afastem da realidade. Subtrair-nos ao que acontece, olhar de fora, transforma-nos em estrangeiros dentro de nossa própria realidade. Ao incluir-nos no que percebemos, nós nos vemos como participantes, tanto do que nos toca de perto como de tudo o que acontece. Atender, recordar e incluir são elementos-chave da compreensão, mas não são suficientes para alcançá-la. Também é necessário entender.

Entender é discernir acerca do que percebemos. Nossa atenção nos permite armazenar grande número de dados, nossa memória recordá-los, nossa atitude inclusiva fazê-los nossos; no entanto, tudo isto não é suficiente para que possamos usar com proveito esse material. Necessitamos avaliar a informação que os fatos nos dão. Mas, sobre que base fazemos essa avaliação? Necessitamos referi-la a um contexto.

Se bem que entendamos uma situação quando nos inteiramos do que aconteceu, onde e como, só a compreendemos quando a referimos a um contexto mais amplo do que o determinado somente por esses dados.

Sempre somos dentro de um contexto maior do que o que temos em mente, ainda que às vezes, por estar ensimesmados, não o reconheçamos. Escolhemos nosso contexto com nossa intenção, nosso interesse e nossos objetivos. A amplitude do contexto dá o grau de nossa compreensão.

Para compreender a informação que avaliamos, contamos com quatro contextos principais: o contexto individual, o de nosso meio imediato, o do meio humano e o grande contexto da totalidade da realidade.

A consideração do contexto individual dá as bases de nossa maneira de entender a nós mesmos e de discernir o que nos acontece. A consideração de nosso meio imediato nos dá os elementos para compreender e resolver nossas situações cotidianas, ter uma apreciação mais objetiva de nós mesmos e adaptar-nos a nossa cultura. A consideração do contexto humano nos serve de referência para distinguir a posição de nossa cultura particular na história e no tempo atual, e a importância relativa do que nos acontece; também nos mostra a necessidade indiscutível de participar. A consideração do grande contexto da totalidade dá sentido transcendente a nossa vida.

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