Extrato da entrevista do Sr. Omar Lazarte com Dom Santiago Bovisio

O PRIMEIRO CONTATO

RC – Como conheceu Dom Santiago?

“Conheci Dom Santiago em 1950, em Mendoza. Meus amigos me haviam dito que era uma pessoa com faculdades paranormais e sobretudo de uma elevada espiritualidade. Eu, todavia, por essa época estava voltado a interesses de outra ordem, especialmente científicos, profissionais e familiares (o meu primeiro filho acabara de nascer), e não criei maiores expectativas em relação a esse encontro. Digo isso justamente para valorizar esse testemunho, de alguém que não estava predisposto ou sugestionado, mas cuja vida seria definitivamente marcada pelo ocorrido imprevisto e inesquecível. Não houve nada de espetacular durante a nossa primeira conversa que, em verdade, foi um tanto desencontrada, não por ele, mas pela minha atitude crítica e polêmica, à época.”

RC – Poderia nos relatar essa primeira conversa?

OL – Quando entrei no local da reunião, ele me saudou muito amável, dizendo: “Senhor Lazarte, que jovem! Parece um menino”. Respondi-lhe, dizendo que tinha 29 anos. Após um silêncio, ele acrescentou: “Isso lhe parece uma pessoa mais velha?” Ao que lhe respondi que as pessoas me davam menos idade do que tinha. Dom Santiago me ofereceu um cafezinho que eu recusei alegando “Não tomo café, não fumo, nem bebo álcool” (estava entusiasmado com a tarefa preventiva como médico recém-formado).Em outro momento, fez referência ao tema de Deus e lhe respondi: “Para que usar esta palavra que tem sido tão mal-empregada?” ao que ele, com humildade, respondeu “Temos de chamar-lhe de alguma forma”. Posteriormente, conversamos sobre a possibilidade de meu ingresso em Cafh. Respondi-lhe: “Veja, vou experimentar, mas se surgir outro movimento social que me pareça mais interessante, optarei por ele”. Ante meus argumentos, disse: “Os partidos e movimentos sociais setoriais não são a solução; a humanidade tem que avançar em seu conjunto”. Esta ideia me agradou.Logo, falou-me muito bem de dois conhecidos comuns: Alberto Maritano e Maria Luisa Petetin, de quem eu não tinha notícias há muito tempo.

Muitos anos depois vim a saber que ambos, docentes, haviam dissertado na Universidade Espiritualista de Rosário, quando Dom Santiago vivia nesta cidade. Naquele momento não dei muita importância ao fato de termos dois conhecidos em comum. Tempos depois, perguntei-lhe como sabia que eu os conhecia, pois não havia falado com nenhum dos presentes sobre esse assunto. Por outro há anos não pensava em nenhum deles. Primeiro, pensei que podia ser transmissão de pensamento (telepatia), mas depois me dei conta que ele podia ver diretamente o meu passado e que, nesse relance, encontrara essas pessoas conhecidas de ambos nos arquivos (engramas) da minha memória.

Também recordo deste primeiro encontro que ele olhou fixamente em direção ao meu estômago. Eu sabia que ele tinha condições de ver a aura astral; pensei que ele estava fazendo uma radiografia visual. Neste momento, disse: “O Sr. está com o estômago um pouco frágil”. Respondi que não tinha nada no estômago, mas sim nos brônquios. Tive asma enquanto vivi no clima úmido do litoral. Ele reiterou que era o estômago que estava debilitado. De fato, uma sondagem no estômago mostrou posteriormente muito pouca quantidade de suco gástrico e de ácido clorídrico.

Dom Santiago tinha visto essa deficiência funcional do estômago antes de que eu o soubesse. Ao terminar a conversa, quando nos despedíamos, saudou-me com um toque de sua mão em meu queixo.
Pensei tratar-se de um costume dos italianos que são mais amáveis e extrovertidos. Entretanto, com o tempo fui interpretando esse gesto diferentemente. Desde o primeiro ano de nosso contato notei que me havia transmitido uma grande energia e me despertado a um outro estado de consciência sem que eu o soubesse, procurasse ou esperasse.
Eu tinha experimentado uma “conversação espiritual”.

A INICIAÇÃO

RC – Como foi sua iniciação na prática de exercícios espirituais?

OL – Minhas primeiras dificuldades foram com a meditação. Minha dificuldade era a invocação a Deus, porque não acreditava em nada. Por esta razão, disseram-me que me abrisse ao que considerava mais elevado quanto ao fundamento do universo. Assim, comecei invocando a energia universal e, logo, não tive problema em chamá-la de Divina Mãe do Universo. Além disso, nos primeiros tempos, iniciei-me na leitura dos grandes místicos do Ocidente e do Oriente com o entusiasmo de quem acaba de descobrir um campo novo. Lia, principalmente, o que se podia aplicar ao desenvolvimento espiritual, em participação com o despertar de uma consciência mais solidária da humanidade.

RC- O Sr. Deixou de lado seu espírito científico e voltado ao social?

OL – Não, ao contrário, mantive nesse novo campo a metodologia e a atitude científica na qual me haviam formado os meus pais e professores. Por isso, posso descrever com total objetividade e detalhes o meu encontro com Dom Santiago. Analisei-me como uma testemunha que não veio sugestionada à entrevista e que tampouco convenceu-se de nada novo ao longo dela. Ele me deixou fazer e contradizê-lo. No entanto, deu-me elementos novos para que tirasse minhas próprias deduções. Durante a entrevista sucederam-se fatos importantes cuja profundidade eu descobriria com o tempo.

RC – Deu-se conta de que ele lhe havia transmitido uma energia especial?

OL – A princípio só notei meu entusiasmo pelos temas espirituais e pela prática da meditação. Minha mulher também o percebeu e, logo, mais algumas pessoas que me conheciam há muitos anos, tais como o meu cunhado Ramón Munoz Soler. Ramón, desde menino, tinha profundo interesse por temas espirituais e, na adolescência, aproximou-se de diversas pessoas que possuíam alta espiritualidade e, também, condições supra sensoriais, sem ter encontrado um mestre, o seu mestre. Quando veio nos visitar em Mendoza e viu minha “conversação espiritual”, entrou em contato imediatamente com Dom Santiago em Buenos Aires. Assim, entrou em contato o mestre que havia buscado por toda a vida.

RC – Esse estado energético-espiritual que lhe transmitiu Dom Santiago permaneceu por muito tempo no senhor?

OL – Seis ou sete meses depois notei que ia perdendo parte dessa força inicial que havia recebido. Assim, entrei em outra etapa em que tomei consciência de que devia trabalhar no meu desenvolvimento espiritual. Abrira-se para mim um espaço para a vida interior e, agora, deveria alcançar um desenvolvimento evolutivo fundamentalmente pelo meu próprio esforço, ao mesmo tempo em que mantinha a entrega feita ao divino desconhecido que intuía em meu interior. Deixando de lado o aspecto descritivo da minha experiência, posso traçar a seguinte hipótese: Dom Santiago despertou em mim uma condição de fé que tem se mantido, graças a Deus, por mais de 50 anos.

RC- Lembra-se de algo mais dessa primeira entrevista?

OL – Sim, ao final da conversa, ele me disse que eu iria entrar em um grupo para praticar a tolerância. Essa indicação, eu a tenho presente até hoje, porque não se consegue realizá-la plenamente jamais.

RC – Como continuou sua relação com Dom Santiago?

OL – Por alguns anos, eu o vi muito pouco… e senti falta de sua presença. Ele me respondeu gentilmente uma carta nesse sentido, dizendo: “Por ora, siga a grande corrente como um peixe na água”. Aludia dessa forma à necessidade de que eu continuasse nessa etapa preparatória, durante a qual muito me ajudou ser curso intitulado “Desenvolvimento Espiritual” que eu via não como uma especulação, mas como uma orientação para a experiência espiritual.Comecei também a participar intimamente da “lenda” de Dom Santiago. Com o tempo fui tomando consciência de quem era nosso Mestre. Ele, entretanto, fazia com que nos fixássemos mais no que havia atrás dele e não nos apegássemos a uma pessoa. Disse-nos em uma ocasião: “Sou só um professor de didática”. Realmente, sempre procurava as melhores estratégias de ensino-aprendizagem. E não só pela palavra, mas com suas atitudes de vida. Além do ensinamento geral que dava, havia outros específicos para a necessidade de cada alma. Essa orientação espiritual era adequada a cada um, segundo suas necessidades, características, circunstância e seu estado de consciência. Foi, sem dúvida, um educador no sentido mais elevado da palavra, assim como também o foi o seu sucessor, Sr. Jorge Waxemberg.

Omar Lazarte conheceu Dom Santiago em 1950. Fez parte dos que, à época, contribuíram para difundir o seu pensamento e sua obra em Mendoza. Seu primeiro encontro com Dom Santiago trouxe à sua inquietude de participação e solidariedade, uma dimensão espiritual.

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