Estudo sobre as origens da meditação

Parte 1 – Pela busca do estado meditativo

Em 2020, toda a complexidade de respostas e sentimentos advindos da pandemia do COVID-19 produziu, entre outras coisas, uma atividade de extensão em rede para Cafh: a Oficina de Meditação.

Esta oficina tem sido um verdadeiro alento para seus partícipes, criando a oportunidade para a orientação técnica inicial sobre a prática da meditação, tendo por base aquela que praticamos em Cafh e, em particular, a denominada “Meditação Discursiva”. Muitos membros de Cafh se fazem presentes, mas há também um grande afluxo de pessoas advindas de outros caminhos e lugares.

A presença nas Oficinas nos rendeu excelentes experiências e observações. Este estudo, por exemplo, foi conduzido a partir de uma indagação de um dos presentes, após uma prática de Meditação Discursiva, que lhe causou estranheza: não se sentava em posição de lótus, não se praticava a contemplação e o relaxamento; e afinal, onde estavam os mantras?

Fomos então fundamentar a resposta dada a este participante sobre a meditação de Cafh estar relacionada à outra tradição de método de meditação, diferente da oriental, relacionada à tradição ocidental.

Enrique Sevilla, com mais de 50 anos de vida em comunidade de Cafh, em diálogo com nossa equipe, revela-nos que Dom Santiago, fundador de Cafh, era um grande estudioso de ciências e de teologia, um manancial de conhecimentos de filosofia, história, antropologia, religiões e caminhos espirituais antigos e esotéricos, de maneira que poderia ter captado influências de alguns destes caminhos em que se aprofundou, para enriquecer o caudal intelectual do corpo místico de Cafh, que então emergia. Mas a originalidade do sistema criado por Santiago Bovísio é incontestável.

Visto isso, o que pudemos então explorar sobre este assunto?

Apesar de o Brasil, a América do Sul, enfim, o continente americano, ser considerado parte da chamada Civilização Ocidental, as técnicas e culturas de meditação oriental, em particular as de origem hindu, ganharam toda a notoriedade no continente.

Em relação à origem humana, nos parece interessante pensar que o processo, conhecido como hominização, retirou a mente humana do silêncio que permeava a existência dos primatas antecessores, para realizar, aos poucos, o seu despertar e de todas as suas possibilidades, ao se considerar o desenvolvimento evolutivo do ser humano, conforme a biologia. Neste sentido, a meditação parece um tipo de recordação, ou uma tentativa de entender este silêncio ancestral que ainda habita em nós. Ainda que sejam sete milhões de anos de negação proposital deste silêncio, na verdade, há que se reconhecer que o desenvolvimento da razão, e de outras habilidades complexas da mente, foi uma necessidade.

A situação se impôs de tal forma que tínhamos que planejar a defesa contra as feras mais poderosas; pensar em como caçar e capturar, sendo mais fracos que as caças, lutarmos para fugir e buscar proteção ante um ambiente hostil e, em diálogo com tudo isso, construir cultura, tecnologia e uma ligação mística com o divino, que certamente estaria em algum lugar daquele silêncio original, que tínhamos obrigatoriamente que deixar de lado se quiséssemos sobreviver.

Depois de todo esse esforço, talvez colocado como grande desafio de sobrevivência e desenvolvimento da razão, para todos nós, chega o momento em que o silêncio e a busca pelo equilíbrio, que consideramos como original, começa a clamar presença. Mas não poderia mais ser aquele silêncio original. Já não somos mais silenciosos. Todos os barulhos que produzimos, toda a razão e a inteligência que nos permitiram sobreviver, estão AQUI. Ou seja: como realizar o antigo silêncio, o antigo contato com o profundo divino, nesta nova condição? Seria então um novo silêncio? Um novo contato? Será isso a meditação?

Além disso, essas novas formas de contato com o interior, esta busca pelo divino, não devem ter surgido de uma vez. Na medida mesma do desenvolvimento humano, da humanização, o despertar para a meditação deve ter ocorrido.

Desta maneira, podemos inferir que as formas de meditação, concentração, desenvolvimento da reflexão, foco, formas de realização, devem ter emergido daquele silêncio da consciência, na direção do que entendemos como humano, no decorrer de milhões de anos. A mente humana emerge do silêncio, a linguagem vai ao poucos se desenvolvendo em cada uma das línguas que falamos (MITHEN, 2015). As primeiras formas de fala, linguagem, a organização das ideias, presumivelmente o despertar da mente, será que não pressupõem algum estado meditativo?

De certo que formas de meditação acompanharam a hominização, de maneira que a busca do estado meditativo pode ter sido uma presença desde sempre.

Esse estudo expressa a opinião do autor, Alfredo Matta, professor e pesquisador da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Será publicado em partes.

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