Pensando a Meditação Ativa

Pensando a Meditação Ativa

Meditações judaica, islâmica e cristã: uma relação entre a Cabala, a Árvore da Vida e os 7 temas da meditação em Cafh.

Aporte da Meditação Judaica

São perceptíveis os pontos de contato, talvez claras influências, das escolas iniciáticas egípcias com as de origem judaica. Não esqueçamos que os judeus permaneceram por muitos anos como escravos no Egito.

São conhecidas as meditações judaicas que têm a forma de fixação mental, introspecção, visualização e percepção emocional, concentração de nomes divinos e concentração em ideias filosóficas, éticas e místicas realizadas a partir da repetição das letras do alfabeto hebreu, que parecem similares às práticas egípcias.

De fato, a relação entre o alfabeto e a meditação seria uma das bases da Cabala. Mais profunda, porém, é a interpretação no sentido da Árvore da Vida e dos Sefirot. Na Torá os 7 dias da semana e os 7 dias da criação atribuem um sentido à construção e à transformação de tudo. Se desejamos entender a meditação em Cafh para além do aspecto da prática meditativa – tendo em vista que para esta, basta meditar -, nos parece necessário aprofundar a compreensão da relação entre a Cabala, a Árvore da Vida e os 7 temas da meditação em Cafh, (HOLLYBOOK, 2001) .

De fato, a meditação hebraica ligada à Cabala e aos Sefirot nos fez pensar em algo que estudamos e praticamos em Cafh: meditações realizadas a partir dos sete temas da simbologia arcaica. A razão humana não pode acessar Deus completamente, senão por meio de suas manifestações ou atributos – os sete níveis interdependentes e interligados de forma ascendente na Árvore da Vida, equivalentes às 7 etapas de transformação. 

As meditações sugeridas pela Cabala são sempre mergulhos de desenvolvimento e de busca por um caminho de crescimento, de um aprimoramento contínuo, que sempre advém e acontece a partir dessas etapas – exatamente devido aos Sefirot, os atributos perceptíveis do divino. Cada mergulho e desenvolvimento nestes 7 atributos propõem uma integração rumo à união divina, ou, ao menos, a uma construção conjunta daquilo trabalhado, a uma síntese preparada para um reinício, no sétimo momento. Essa lógica está totalmente presente na Cabala, mas está também, segundo nosso entendimento, nas práticas do Método de Cafh, especialmente na meditação.

Parece-nos natural, em um mundo onde a meditação oriental se tornou tão conhecida a compreensão da meditação como técnica para o esvaziamento da mente, por isso ao deparar-se com as técnicas de meditação ensinadas em Cafh, o interessado busque nessas entender a  origem, similitudes e diferenças de outros métodos de meditação.

As propostas de meditação na Cabala

Encontramos as meditações dos 7 céus, com os 7 palácios de Yetzirah, na qual cada palácio está em um céu, com características próprias. Shamayim é o primeiro palácio: o céu do firmamento, onde estão o sol e os planetas, ou seja, o mundo material e todas as suas relações cotidianas. Shemai Hashamayim, o segundo céu, é o céu da água das águas. Aqui nascem anjos novos todos os dias, que passam a vida em orações. 

O terceiro céu é o Zevul, o lar do Príncipe, cercado por seus anjos ministradores. Araphel é o quarto céu, o céu da Torá. Trata-se do céu onde a Torá foi entregue, representando o monte Sinai. O quinto céu é Shehakim, os céus. Trata-se da Jerusalém do céu: o Templo – a Mesa, Arca, Menorá e todos os utensílios estão aqui. Já o sexto céu é o Mahon-Aravot: a jornada de 500 anos de Shehakim a Mahon. No caminho há neve e granizo, bem como recompensa para os justos e punição para os ímpios após 500 anos, onde estão almas a nascer. E o sétimo céu é o Trono de Glória: o céu do trono de Deus. Abaixo do trono, as almas esperam para retornar ao nosso mundo.

Há uma outra meditação, a das 7 câmaras. A alma que desencarna deve trilhar estas 7 câmaras: de Safira, da essência do céu, do Lustre, do Mérito, do Amor, do Desejo e a do Santo dos Santos ou da Ressurreição. Cada câmara tem uma relação com as almas e o caminho divino. 

Nas duas meditações acima, o interessado deve refletir sobre a presença nos céus ou nas câmaras.

A exploração dos Sefirot nos revela muitas das bases das meditações ocidentais. Há, por exemplo, a preciosidade da exploração dos Mundos Sefiróticos: mundos que devemos atravessar para ter uma experiência de ascensão ao Sefirot.

O primeiro reino dos Sefirot é o de Malchuts. Nele o peregrino que narra sua meditação vê um brilho, uma iluminação tão forte advinda dos reinos superiores, que se vê na condição de querer seguir aos níveis superiores, pois percebe sua própria falta de luz. Esta explicação parece próxima do que se descreve em Cafh com o tema de meditação “A Dama do Véu Negro”* e seu efeito, aborrecimento. O segundo reino é o de Yesod. Aqui o peregrino se depara com a necessidade de seguir, mas também com aquilo que lhe atrapalha a viagem. Através da oração, o peregrino encontra o caminho auxiliado pelos anjos Gabriel e Miguel. Aparece aqui mais uma relação entre a ideia de superar dificuldades com o tema de meditação praticada em Cafh O Abismo*, cujo efeito é a desolação.

Tiferet é o terceiro reino. A passagem para o terceiro reino é um pequeno buraco de luz. Ao chegar, o peregrino tem uma visão do Jardim do Éden, se encontrando com Adão e Eva, e ali deve ficar um pouco em respeito aos ancestrais. À sua esquerda está a Árvore da Vida, e, à direita, a Árvore do Conhecimento. Só a ajuda dos anjos o mantém no reino. Entretanto, é necessário seguir mais para o alto da Árvore da Vida. O peregrino chama então o nome de Ehehyeh para prosseguir para o alto. Para tanto, há a necessidade de desapegar dos ancestrais e a decisão em chamar o nome que o levará adiante. Aí também há similaridade com o tema de meditação praticado em Cafh chamado “Os dois caminhos’’*, cujo efeito é o desapego. 

No reino de Keter, encontramos o locus onde a vontade de Deus toma forma. O peregrino participa da oração de cura, ao se oferecer para jogar o lixo fora. Após lavar as mãos, se dedica a escutar as orações profundas deste reino. Também aqui se nota um paralelismo com o tema “O Estandarte*, que tem por eleito a eleição.

O quinto reino é o dos Quatro Anjos. Aí estão Micael, Gabriel, Rafael e Uriel. E aí se vê que assim como a profecia de Deus se cumpriu na destruição do Templo, também se cumpre em sua reconstrução. Em Cafh, temos a meditação “O templo de ouro”*, cujo efeito é o efeito consolo.

O reino do Templo, o sexto, foi acessado quando Micael e Gabriel empurraram o peregrino por uma nuvem na base do tempo, chegando ao interior do templo. Lá estava a Árvore da Vida, e o Pé de Romã, a Árvore do conhecimento do Bem e do Mal. Havia também um escritório, com muitos livros, e um teto de vidro tornava possível contemplar todas as estrelas. Com o tema de meditação “O véu de Aheia”, Cafh propõe como efeito o gozo.

Por fim, o sétimo e último reino descrito neste estudo da Cabala era o do Messias. Neste reino se encontra o Messias. Desta forma, o Peregrino então fez várias perguntas sobre a família, sobre como ter bons amigos, sobre o trabalho. E a resposta era só uma: amar a Deus intensamente.  É neste reino que se aprende a técnica de subir ou descer nos Sefirot. Neste reino também estão Abraão e Sara. É Abraão que conta sobre ver o templo dentro de si, e como a santidade está aí dentro também. Em Cafh, o sétimo tema de meditação é a “Ressurreição de Hes”, com efeito arroubamento.

Esta viagem poderia muito bem ter sido feita por um filho de Cafh meditando, segundo os 7 temas e indica uma proximidade com as meditações baseadas na Cabala e na construção do caminho dos Sefirot. Parece também bem integrada à mística e ao mergulho sobre si mesmo e sobre o amor.

O livro citado prossegue revelando outras práticas meditativas da Cabala, como a Meditação com Foco Angélico, realizada na relação com os 4 anjos, onde se vê o descenso deles com toda a miríade de cores próprios, formando um quadrado que será base de uma pirâmide cujo vértice está sobre quem medita. O exercício consiste em tentar perceber o universo e seu processo de expansão desde o início.

Como vimos, são meditações que acontecem no caminho em busca da integração com os Sefirot Propõem um desenvolvimento naquele que as pratica. Esta questão poderia  indicar uma construção similar da meditação em Cafh? 

Temos, no entanto, o caminho próprio dado pela ensinança e a proposta de renúncia, desapego e busca da mística do coração que nos foi legada pelo trabalho de Dom Santiago, e daqueles que com ele trataram de assentar o corpo místico de Cafh. É aí que encontramos a meditação e o caminho próprio proposto em Cafh e a que dedicaremos mais tempo oportunamente.

Neste estudo, a intenção era encontrar a dimensão genética e de aproximação do caminho trilhado pela técnica de meditação em Cafh. Cabe agora ao leitor confirmar se  conseguimos esse intuito.

A meditação islâmica e cristã 

Acrescentaríamos um pouco das meditações advindas do Islã, técnicas sufistas que trabalham com as “Lembranças de Deus”, obtidas com a repetição de frases curtas, ou técnicas como o Taffakur – contemplar e refletir, com pensamentos firmes e buscando a presença e consciência (ref).

Também seria importante trazer algumas informações sobre as meditações cristãs. O cristianismo oriental desenvolveu o que se chamou Oração Constante – contemplação de Deus, que acontecia com a memorização e recitação das escrituras. Já no Ocidente, os Beneditinos introduziram o conjunto de oração pública, trabalho manual e leitura espiritual como rigorosas ascéticas de prática meditativa “Ora et labora.” De qualquer forma, as meditações cristãs também focam no desenvolvimento da consciência (Ref.), finalidade da ascética-mística de Cafh .

Arriscamos interpretar, sugerindo que cada um deve refletir livremente sobre o assunto, que as meditações hebraicas, islâmicas, cristãs, gregas e egípcias – de tradição ocidental, tem em comum o foco na construção e desenvolvimento da consciência, a busca pelo aprofundamento no entendimento interior.

Mais uma vez citamos Sevilla (2020), que interpreta a tendência das meditações ocidentais como sendo meditações do ser – significa dizer que giram em torno do desenvolvimento de algum crescimento do ser, algum ganho “positivo”. E acrescenta que mesmo as meditações orientais, ao serem adotadas pelo Ocidente, passaram a buscar resultados de crescimento em contraposição às versões originais do Oriente, focadas no “ não ser”.

Ainda pensando como Sevilla, a meditação em Cafh, mesmo que próxima da tradição Ocidental, poderia ser entendida como uma meditação do “ser e do não ser”, em um devenir contínuo, tendo saído do foco positivo restrito, renovado permanentemente em um processo de sete passos  no caminho de busca pela união divina.

 

Referências

BOVISIO, Santiago. Religiões comparadas. Buenos Aires: Fundation Cafh, 2001. Disponível em: < https://www.santiagobovisio.com/por/liv/28livro.htm#11 >, Acesso em 01 de maio de 2021.

ELLI GOLD. ANCIENT GREEK MEDITATION. Melbourne: ELLI GOLD, 2021. Disponível em: < https://elligold.com/ancient-greek-meditation/#:~:text=Ancient%20Greek%20Meditation%20Contrary%20to%20popular%20perception%2C%20meditation,each%20session%20meditations%2C%20based%20on%20ancient%20Greek%20techniques.>, Acesso em 01 de maio de 2021.

HOLLYBOOK. Kabbalah Meditation from Torah to Self-improvement to Prophecy. Copenhagen: HOLLYBOOK, 2001. Disponível em: < https://www.holybooks.com/wp-content/uploads/Kabbalah-Meditation-from-Torah-to-selfimprovement.pdf > Acesso em 01 de maio de 2021.

IRWIN, Terence. Classical Thought. Oxford: Oxford University Press, 1988.

ROLLAND. Da Kabala ao Kabesh: magia e sabedoria dos sacerdotes do Antigo Egito. São Paulo: Instituto Nefru Editora, 1998.

SOCIEDADE TAOISTA DO BRASIL. A MEDITAÇÃO TAOISTA. Rio de Janeiro: Sociedade Taoista do Brasil, 2012. Disponível em: < http://sociedadetaoista.com.br/blog/atividades/meditacao-taoista-2/#:~:text=Medita%C3%A7%C3%A3o%20Tao%C3%ADsta%20O%20Caminho%20espiritual%20tao%C3%ADsta%20tem%20como,pr%C3%A1ticas%20que%20buscam%20a%20cont%C3%ADnua%20expans%C3%A3o%20da%20consci%C3%AAncia.>, Acesso em 23 de abril de 2021.

WIKIPEDIA. History of meditation. In: Wikipédia, the free encyclopedia. San Francisco. Wikipédia Foundation, 2018. Disponível em: <https://en.wikipedia.org/wiki/History_of_meditation>, Acesso em 23 de abril de 2021.

WYNNE, Alexander. THE ORIGIN OF BUDDHIST MEDITATION. London: Routledge, 2007. Disponível em: <http://www.ahandfulofleaves.org/documents/The%20Origin%20of%20Buddhist%20Meditation_Alexande%20Wynne.pdf>, Acesso em 23 de abril de 2021.

Livro do Sr Enrique??? Sim, melhor colocar aqui e vamos colocar também na seção de livros,resenhas.

 

Nota da Editora

Este texto inaugura uma vertente dedicada ao estudo e pesquisa dentro da editoria ComCiência, daí a razão de oferecermos citações e referências bibliográficas. Capitaneada pelo Professor Doutor Alfredo Matta, apresenta a percepção  do autor embasada em publicações e textos pertinentes ao objeto do estudo .

 

 

Sobre este assunto temos uma sugestão de leitura, que sempre deve ser crítica, ao mesmo tempo atenta, do interessante livro “Kabbalah Meditation from Torah to Self-improvement to Prophecy”, que encontramos na rede Internet no endereço WEB:

 <https://www.holybooks.com/wp-content/uploads/Kabbalah-Meditation-from-Torah-to-selfimprovement.pdf >.

Trata-se de uma obra que nos apresenta uma importante reflexão sobre os Sefirot e sobre os arcanjos, apresentando formas de meditação hebraica. Mais ainda do que o encontrado sobre gregos e egípcios, a meditação hebraica nos parece próxima, dentro das tradições ocidentais (HOLLYBOOK, 2001).

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