Do instinto de sobrevivência à Mística do Coração

Do instinto de sobrevivência à Mística do Coração

Desde o momento em que a ciência se desenvolveu sem os entraves das crenças, o processo do desenvolvimento da humanidade tem dado passos gigantescos. E essa mesma ciência permitiu que muitos pressupostos, superstições e crenças se desprendessem do imaginário das religiões, o que lhes tirou poder e relevância.

Isso deu espaço para que se desenvolvesse o Humanismo, e nele, no dizer do eminente historiador e escritor Yuval Noah Harari, o liberalismo, o socialismo e o racismo. Entretanto, contaminadas estas três direções pelo egoísmo e pela separatividade, deu-se como resultado uma humanidade sumamente desenvolvida em ciência e tecnologia, ao mesmo tempo em que desumanizada e fragmentada em movimentos antagônicos e destrutivos. E isso pela presença de duas forças imanentes que movimentam o ser humano: o instinto de sobrevivência e a capacidade inata de criar ilusões.

O instinto de sobrevivência está presente durante toda vida do ser em sua quotidiana luta por permanecer vivo. Dele derivam os imperativos de saciar a sede, a fome, de abrigar o corpo para não sucumbir às inclemências do tempo, a necessidade de satisfazer o instinto de reprodução, de competir para ser o melhor, de desenvolver medicinas e técnicas para se manter saudável etc. Ou seja, farmácias, supermercados, laboratórios, indústrias, agricultura, transportes… tudo gira ao redor do imperioso instinto de sobrevivência.

Já a capacidade inata de criar ilusões está presente desde o momento em que o ser começa a pensar, a tomar consciência de suas limitações e da fragilidade ante o que permanentemente ameaça sua sobrevivência. O ser precisa criar alguém que o proteja da desgraça e da morte. Dessa capacidade se derivam as religiões com seus deuses, os exorcismos e adivinhações, as fantasias de anjos e arcanjos, a imaginação do que não existe, a significação de signos, predições, filosofias, mestres e iluminados. A arte, a poesia, a dança, o folclore, os mitos, as criações permanentes de fantasias e estórias imaginadas, tudo gira e dá sentido ao ser humano para sonhar permanentemente com algo a mais do que já existe.

Desta forma, o instinto de sobrevivência e a capacidade para criar ilusões se fazem presentes em tudo que é vivo: animais, plantas e até planetas e estrelas. Porém, no ser humano, essas duas forças parecem ter crescido desmesuradamente e se autofecundado cada vez com mais força, gerando separatividade, guerras e conflitos.

Cafh participa com toda a humanidade dessas duas forças motivadoras oferecendo, para o instinto de sobrevivência, a Ascética da Renúncia, e, para a capacidade inata de criar ilusões, a Mística do Coração.

Ao inserir no instinto de sobrevivência a Ascética da Renúncia, o ser passa a viver conscientemente a impermanência, não do criado ou construído, mas da doentia pretensão de possuí-lo. E, ao associar à capacidade de criar ilusões a Mística do Coração, o ser se une pelo amor à humanidade imortal, vencendo sua própria morte individual.

Assim, ao descobrir a Ascética da Renúncia como uma lei do devenir, o ser humano se capacita a compreender e controlar seus passos. E unido à força poderosa do amor à Mística do Coração, o ser abre uma porta para se liberar do negativo do egoísmo, da separatividade, da violência, do ilusório e do supersticioso, impulsionando a humanidade ao seu mais grandioso porvir.

Associando a Ascética da Renúncia e a Mística do Coração às forças inatas do instinto de sobrevivência e da criação de ilusões, a ciência e a espiritualidade se unem em uma direção transcendente de união do Ser Humano ao perpetuamente indagado Desconhecido. Em troca do ilimitado pelo ilusório, criado pela mente humana (deuses, paraísos etc.), o Homem tem agora outro ilimitado – mas não pelo ilusório, e sim por um utópico realizável que se apoia na ciência e na espiritualidade: o futuro de evolução inesgotável.

 

Enrique Sevilla

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